quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Uberlândia - relato de performance

Em julho de 2009 realizei a performance em Uberlândia – MG, onde fui contemplado no “Arte Urbana”. Um edital municipal de artes visuais, que seleciona anualmente cinco trabalhos a seres feitos nos espaços da cidade.

A árvore, um ipê rosa que ainda mantinha as últimas flores da estação. Ela fica num calçadão do centro, entre as grades do fórum e um ponto de ônibus, em meio a bancos de cimento espalhados e outras duas árvores. É um lugar de fluxo para alguns, e de espera para outros.

A cobertura do trabalho na mídia é um caso a se detalhar nesta experiência. Houve um grande interesse em noticiar. Um pouco por estar vinculado a um edital municipal, outro tanto por um interesse sintomático em tornar pública esta ação considerada irreverente. A notícia saiu desde emissoras de rádio AM ao jornal da noite da Globo local, com direito a chamadas de efeito durante o intervalo: “Artista pára o centro da cidade”. Para minha surpresa, depois de exibirem a matéria no jornal, ainda fizeram uma chamada no intervalo da novela “Caminho das Índias”, garantindo que a notícia chegasse ao maior número de pessoas possíveis.

Da rede local do SBT, haviam duas equipes, de programas diferentes marcando presença. Uma delas, fez comigo uma entrevista antes da performance. O jornal impresso, colocou uma matéria na capa do caderno Revista no dia seguinte.

Não sei exatamente o que gerou tanto interesse por estas mídias de massa, se era pelo trabalho gerar curiosidade e poder ser mostrado como uma excentricidade, ou se era uma forma de dizer ao povo: não se assustem, é só um artista. Está tudo sobre controle.

Para mim, o mais interessante no fato, foi a oportunidade de “negar”a mídia. Os repórteres e suas equipes foram lá querendo fazer entrevista e eu não falava com eles, não saia do lugar. O silêncio faz parte da performance. Ficava ali olhando o “misancene”. Me divertindo com as situações, como a da repórter da Globo local que subiu num banco de cimento, para ser filmada com o microfone na mão, apontado para mim.

Um dos idealizadores e responsável pelo edital, o artista plástico João Virmondes acompanhou a performance durante quase todo o tempo. Ficava ali sentado em um dos bancos do calçadão. Para quem olhava com mais atenção, era fácil reconhecer que ele tinha alguma relação com o acontecimento. A situação acabou criando uma ambiente de comunicação mediada, entre o trabalho e o público passante. Muitas pessoas iam até ele e perguntava o que era aquilo. Ele explicava que era um trabalho de arte, que fazia parte de um edital municipal, e quando as pessoas seguiam com as perguntas ele ia respondendo com outras perguntas, provocando reflexões, que se configuraram numa ação didática de aproximação entre arte e público. Reconfigurações do ambiente na performance.

A maioria dos passantes, não paravam no local, passavam direto. Algumas olhavam, sorriam, apontavam, ignoravam. Outras tentavam falar comigo. Vi um advogado na porta do fórum que esbravejava e gesticulava apontando para mim, parecia realmente incomodado. A cada ônibus que parava, muitas cabeças se moviam para me ver e comentar. Um senhor, na entrevista à TV disse que eu “tava era muito forgado”. Um garoto disse que eu estava chique. Uma moça, depois de ficar ali por um bom tempo tentando falar comigo, e insistindo que eu descesse, se despediu dizendo: “moço, seu trabalho é muito generoso”. Uma senhora disse, numa entrevista, que ela subiria comigo se não tivesse problemas nas costas, “porque nós devemos estar unidos, pela paz.”

Nos dias seguintes haviam rastros da performance nos comentários sobre “o homem da árvore.” Um prolongamento da ação pela oralidade, que durou algum tempo.

Vale dar o contexto da cidade. Médio porte, tradição política ruralista, população superior a 650 mil habitantes. Se destaca no setor de logística e distribuição de produtos. Tem uma universidade federal que oferece hoje mais de 50 cursos.

...

Cada vez que faço o “hominidae”, muitas variáveis se configuram para dar forma a experiência. A cidade, o local, o contexto, o público, o clima, meu corpo. Certamente existem fatores culturas que já predispõe um “sotaque” nas relações sociais. As cidades tem suas especificidades.

Em Uberlândia, certamente a presença da mídia, dos videomakers e do fotógrafo que contratei, assim como os noticiários que foram dados ao longo do dia, interferiram na ambiência da performance.

Se por um lado, isto possa diluir o potencial provocador no contato ao vivo, por outro, aumentou o alcance da ação. ‘Um homem, passou o dia em cima da árvore, no centro da cidade.’

Poderá está efêmera cisão na paisagem, contribuir na complexificação da cidade?
É uma pergunta para o vento do cerrado, que responde soprando necessidades.


foto: Thiago Carvalho


foto: Thiago Carvalho


foto: Thiago Carvalho

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